sábado, 9 de fevereiro de 2008

Quando o amor vence a razão

Quando Nosso Senhor veio ao mundo, trouxe-nos um mandamento novo: “Como eu vos tenho amado,assim também vós deveis amar-vos uns aos outros” (Jo 13,34). Este amor levado às últimas conseqüências propiciou-nos a Redenção. E um relacionamento humano regrado e bem conduzido deve seguir o exemplo do Divino Mestre. O verdadeiro amor ao próximo é aquele que se nutre por outrem por amor a Deus e que tem o Criador como centro, visando a santidade daqueles que se amam. Já ensinava Santo Agostinho que só existem dois amores: ou se ama a si mesmo até o esquecimento de Deus, ou se ama a Deus até o esquecimento de si mesmo.

Assim foi Santa Escolástica, almA inocente e cheia de amor a Deus, de quem pouco se conhece, mas que, abrindo-se à sua graça, adquiriu excepcional força de alma e logrou chegar à honra dos altares. Sua história está intimamente ligada à daquele que por desígnios da Providência nasceu com ela para a vida, o grande São Bento, seu irmão gêmeo e pai do monacato ocidental, a quem amou com todo o seu coração.

Nasceram Escolástica e Bento em Núrsia, na Úmbria, região da Itália situada ao pé dos montes Apeninos, no ano 480. Como seu irmão, teve ela uma educação primorosa. Com seus pais, muito católicos e tementes a Deus, constituíam uma das famílias mais distintas daquelas montanhas. Modelo de donzela cristã, Escolástica era piedosa, virtuosa, cultivava a oração e era inimiga do espírito do mundo e das vaidades.

Sempre caminhou em uníssono com seu irmão Bento, unidos já antes de nascer e irmãos gêmeos também de alma.

Com a morte dos pais, Escolástica vivia mais recolhida no retiro de sua casa. Quando se inteirou que seu irmão deixara o deserto de Subiaco e fundara o célebre mosteiro de Monte Cassino, decidiu ela professar a mesma perfeição evangélica, distribuindo todos os seus haveres aos pobres e partindo com uma criada em busca do irmão.

Encontrando-o, explicou-lhe suas intenções de passar o resto da vida numa solidão como a dele e suplicoulhe que fosse seu pai espiritual, prescrevendo-lhe as regras que deveria seguir para o aperfeiçoamento de sua alma. São Bento, já conhecendo a vocação da irmã, aceitou-a e mandou construir para ela e a criada uma cela não muito longe do mosteiro, dando-lhe basicamente a mesma regra de seus monges.

A fama de santidade desta nova eremita foi crescendo e, pouco a pouco, se juntaram a ela muitas outras jovens que se sentiam chamadas para a vida monástica, colocando-se todas sob a sua direção, juntamente com a de São Bento, formando assim uma nova Ordem feminina, mais tarde conhecida como das Beneditinas, que chegou a ter 14.000 conventos espalhados por todo o Ocidente.

A cada ano, alguns dias antes da Quaresma, encontravam-se Bento e Escolástica a meio caminho entre os dois conventos, numa casinha que ali havia para este fim. Passavam o dia em colóquios espirituais, para depois tornarem a ver-se no ano seguinte. Um dos capítulos do livro “Diálogos”, de São Gregório Magno, ajudou a salsalvar do esquecimento o nome desta grande santa que tem lugar de predileção entre as virgens consagradas. O grande Papa santo narra com simplicidade o último encontro de São Bento e Santa Escolástica, em que a inocência e o amor venceram a própria razão.

Era a primeira quinta-feira da Quaresma de 547. São Bento foi estar com sua irmã na casinha de costume. Passaram todo o dia falando de Deus. Ao entardecer, levantou-se São Bento decidido a regressar a seu mosteiro, para voltar apenas no próximo ano.

Pressentindo que sua morte viria logo, Santa Escolástica pediu ao irmão que passassem ali a noite e não interrompessem tão abençoado convívio. Ao que o irmão respondeu:

— Que dizes? Não sabes que não posso passar a noite fora da clausura do convento?


Escolástica nada disse. Apenas abaixou a cabeça e, na inocência de seu coração, pediu a Deus que lhe concedesse a graça de estar um pouco mais com seu irmão e pai espiritual, a quem tanto amava.

No mesmo instante o céu se toldou. Raios e trovões encheram o firmamento de luz e estrondos. A chuva começou a cair torrencialmente. Era impossível subir o Monte Cassino naquelas condições.


Escolástica apenas perguntou a seu irmão:

— Então, não vais sair?

São Bento, percebendo o que se havia passado, perguntou-lhe:

— Que fizeste, minha irmã? Deus te perdoe por isso...

— Eu te pedi e não quiseste me atender. Pedi a Deus e Ele me ouviu — respondeu a cândida virgem.


Passaram aquela noite em santo convívio, podendo o santo fundador regressar ao seu mosteiro apenas no outro dia pela manhã. De fato, confirmou-se o pressentimento de Escolástica. Entregou sua alma ao Criador três dias depois deste belo fato. São Bento viu, da janela de sua cela, a alma de Escolástica subir ao céu sob a forma de uma branca pomba, símbolo da inocência que ela sempre teve. Levou o corpo para seu mosteiro e aí o enterrou no túmulo que havia preparado para si próprio. Alguns meses mais tarde também faleceu São Bento. Ficaram assim unidos na morte aqueles dois irmãos que na vida terrena se haviam unido pela vocação.

Comentando este fato da vida dos dois grandes santos, São Gregório diz que o procedimento de Santa Escolástica foi correto, e Deus quis mostrar a força de alma de uma inocente, que colocou o amor a Ele acima até da própria razão ou regra. Segundo São João, “Deus é amor” (I Jo 4, 7) e não é de admirar que Santa Escolástica tenha sido mais poderosa que seu irmão, na força de sua oração cheia de amor. “Pôde mais quem amou mais”, ensina São Gregório. Aqui o amor venceu a razão, nesta singular contenda.

Peçamos a Santa Escolástica a graça da restauração de nossa inocência batismal, para que cresça o amor a Deus em nossa alma e possamos ter sua força espiritual para dizer com toda propriedade as palavras de São Paulo: “Tudo posso naquele que me conforta” (Fl 4, 13).


Fonte: revista Arautos do Evangelho, nº 14.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

O poder do rosário

Corria o ano de 1879. O bom pároco da igrejinha da vila de Cap-de-la-Madeleine, em Quebec, Canadá, achava-se diante de um sério problema: o inverno tinha sido demasiadamente ameno...
Os que já experimentaram a intensidade do inverno na América do Norte, com seus ventos cortantes, nevadas colossais e temperaturas de gelar os ossos, por certo achariam estranho, ver o pároco todo posto em oração, não para agradecer uma estação tão suave, mas para implorar à Santíssima Virgem com ardor, frio, muito frio... Nossa Senhora, como verdadeira mãe, compreendeu o que ele queria e o atendeu generosamente. E essa é a nossa história, na qual poderemos venerar a solicitude e o zelo com que Maria guia seus filhos para a glória de Cristo
Nosso Senhor. Quando o Pe. Desilets recebeu, em 1864, uma igreja pequenina nessa província francófona, encontrou uma paróquia em crise.
Por ter ficado muito tempo sem pároco, recebendo apenas a visita de padres viajantes que ministravam os sacramentos em numerosas igrejas daquele vasto território, muitos fiéis tornaram-se indiferentes à sua fé Católica. A capelinha, apesar de tão pequena, era ampla demais para o reduzido número de fiéis que ainda freqüentavam as Missas. Nessa lamentável situação, o novo pároco se dirigiu à Santíssima Virgem, sob a invocação de Nossa Senhora do Rosário. Zelosamente encorajava os seus paroquianos a rezarem o terço com piedade. Pregava a beleza e eficácia desta oração tão amada por Maria e consagrou a Ela a comunidade.
Os resultados aos poucos se fizeram sentir! A graça foi operando prodígios nas almas, e o sacerdote, passados 15 anos desde que chegara àquele local, viu-se diante de um sério e agradável problema: ter de construir uma igreja bem maior. Em combinação com seus paroquianos, decidiu dar início ao projeto no inverno, quando o largo rio São Lourenço, que passava perto da igreja, se congela e sua superfície se transforma numa firme estrada de gelo, por onde podem passar os cavalos e trenós, carregando as pedras e outros materiais necessários para a construção; processo muito mais econômico do que o transporte em barcos.
Chegado o mês de novembro, o Pe. Desilets e seus paroquianos começaram a rezar pela rápida formação do gelo. Porém, um inverno inesperadamente ameno nos meses de dezembro, janeiro e fevereiro foi adiando a realização do plano. O bom pároco, redobrando seu fervor, prometeu a Nossa Senhora que, se Ela obtivesse uma ponte de gelo,ele não só construiria uma nova igreja, mas preservaria a anterior e a dedicaria à sua honra, sob o título de Nossa Senhora do Rosário.
Chegou o mês de março e começaram as chuvas. Os paroquianos, com bom senso e pouca fé, sugeriram ao pároco que esperasse até o inverno seguinte. Mas o sacerdote continuou rezando, cheio de confiança em Maria, argumentando que, se não construísse a igreja naquele ano, muitas Missas não seriam celebradas e, conseqüentemente, muitos pecados a mais talvez fossem cometidos.
A primavera já se aproximava, mas, curiosamente, ou quiçá miraculosamente, a temperatura de repente começou a cair. A festa de São José, padroeiro e protetor do Canadá, se aproximava. O padre coadjutor anunciou que haveria uma Missa solene no dia 19 de março em honra do casto esposo da Santíssima Virgem, na qual se pediria, por sua intercessão, a formação da ponte de gelo. Após a Missa, juntamente com alguns paroquianos, o sacerdote foi examinar como estava o rio. Qual não foi a surpresa de todos, quando viram que o forte vento do dia anterior havia trazido grandes blocos de gelo, que se encaixaram perfeitamente de modo a formar uma ponte.
Cheios de alegria, correram de volta para contar o ocorrido ao Pe. Desilets e a todo o povo. Com redobrada energia, a comunidade inteira pôs mãos à obra, aproveitando essa maravilha operada por Deus. O pároco, que havia rezado inúmeros terços pela obtenção do milagre, infelizmente não pôde estar junto a seus paroquianos, devido a uma súbita enfermidade, mas escreveu uma carta encorajando os fiéis, que lhes foi lida pelo padre coadjutor: .Vossas orações perseverantes estão sendo agora atendidas. Contra toda a expectativa, temos agora uma ponte pela qual podemos passar carregando as pedras para a nossa igreja. Vejam o poder da oração....

O trabalho começou na própria festa de São José e continuou por alguns dias. Em uma só jornada, passaram 175 trenós cheios de pedras pela .Ponte do Rosário. (popularmente assim chamada a ponte de gelo). Todos se dedicavam ao labor sem interrupção. .Era extraordinário, um verdadeiro milagre! Algo verdadeiramente impossível!. . relatou um dos presentes, anos depois.O pároco convocou todas as mulheres e crianças para recitarem o terço, enquanto o projeto se transformava em realidade, e ele mesmo era visto muitas vezes, de terço na mão, rezando diante de uma imagem de Nossa Senhora, dentro da igreja. Os homens costumavam rezar inúmeras .Ave-Marias. enquanto trabalhavam. Por fim, no preciso momento em que se completou a quantidade de pedras necessárias para a construção da nova igreja, a ponte começou a se desfazer. Então, a ação sobrenatural tornou-se evidente. Na festa do Santo Rosário do ano seguinte, a nova igreja foi inaugurada e a velha igrejinha anterior passou a ser conhecida como capela do Santo Rosário, tornando- se rapidamente um local de peregrinação. Contudo, o Pe. Desilets ansiava por mais um sinal do Céu, que confirmasse estarem seus anseios de acordo com os desejos de Nossa Senhora. No dia da dedicação oficial da capela em louvor a Maria, o sacerdote estava rezando diante da imagem de Nossa Senhora do Rosário, quando algo extraordinário aconteceu. O fato, presenciado por várias pessoas, foi assim descrito por uma das testemunhas: .A imagem da Virgem, cujos olhos estão voltados para baixo, repentinamente os levantou e permaneceu longo tempo com eles totalmente abertos. O olhar da Virgem era firme e voltado para frente. Não poderia ser uma ilusão, pois a face d.Ela estava inteiramente iluminada, devido aos brilhantes raios do sol que entravam pelas janelas, os quais, aliás, iluminavam o santuário todo. Os olhos bem formados eram negros e em admirável harmonia com as feições da sua face.. Estava concedido o sinal! Nossa Senhora assim mostrava a seus filhos canadenses e aos do mundo inteiro, que Ela não só atende os pedidos feitos através de recitação do Rosário, mas também acompanha, com um vivo olhar maternal, aqueles que a Ela recorrem com confiança. Cap-de-la-Madeleine tornou-se o Santuário Nacional do Canadá, tonificando dessa forma a devoção a Nossa Senhora do Rosário, magnífica invocação d.Aquela que sempre será a medianeira universal de todos os fiéis católicos.

Fonte: Revista Arautos do Evangelho, nº 13.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

O Fundador: Pe. João Scognamiglio Clá Dias


Natural de São Paulo, já nos bancos escolares procurava organizar com seus colegas um movimento para dar aos jovens um sentido moral e virtuoso à existência. Ingressou nas Congregações Marianas e também na Ordem Terceira do Carmo, sendo um ativo líder universitário católico nos anos que precederam a revolução da Sorbonne, de maio de 1968. Cursou Direito na prestigiosa Faculdade do Largo de São Francisco, em São Paulo (sua cidade natal), ao mesmo tempo em que aperfeiçoava seus conhecimentos musicais com o renomado maestro Miguel Arqueróns, regente do Coral Paulistano do Teatro Municipal de São Paulo.

Prestou serviço militar na Companhia de Guardas, onde recebeu uma das maiores condecorações brasileiras por sua disciplina e aproveitamento: a “Medalha Marechal Hermes – Aplicação e Estudo”. Realizou arriscadas proezas como pára-quedista, em numerosos saltos.

Para os estudos teológicos aprimorou-se com os grandes catedráticos de Salamanca (Espanha), como o Pe. Arturo Alonso Lobo O.P., o Pe. Marcelino Cabreros de Anta C.M.F., o Pe. Victorino Rodríguez y Rodríguez O.P., o Pe. Esteban Gómez O.P., o Pe. Antonio Royo Marín O.P., o Pe. Teófilo Urdánoz O.P. e o Pe. Armando Bandera O.P. Como demonstração de profundo agradecimento aos seus mestres, divulgou anos depois as biografias de vários deles, com edições na Espanha e nos Estados Unidos: “Antonio Royo Marín, mestre de espiritualidade, brilhante pregador e famoso escritor”, “Pe. Cabreros de Anta CMF, firme pilar do Direito Canônico em nosso século”, etc...

Preocupando-se sempre com a formação dos jovens, organizou numerosas atividades culturais com clara inspiração católica, e também centros de acolhida. Em 1970 iniciou uma experiência de vida comunitária a fim de melhor se dedicar ao apostolado, em um antigo imóvel beneditino, em São Paulo. O movimento de evangelização se desenvolveu a ponto de ser reconhecido pela Santa Sé em 2001, como uma Associação Internacional de Direito Pontifício, os Arautos do Evangelho, que hoje estende suas atividades a 57 países.

Em todos os ambientes nos quais atuou, o Pe. João Clá destacou-se por seu testemunho de fé, sempre vivida e transmitida com alegria. Dotado de admirável oratória, proferiu palestras em vários auditórios da Europa e das Américas, demonstrando habilidade em infundir nos corações o entusiasmo para as verdades da Fé, o ânimo para a prática das virtudes e a certeza da vitória da Santa Igreja Católica na guerra contra o materialismo, o hedonismo e o relativismo dos nossos dias.

Dotado de fino talento musical, fundou mais de 30 coros e bandas sinfônicas – e também uma orquestra – em duas dezenas de países. Dirige o Coro e Orquestra Internacional dos Arautos do Evangelho, que já realizou turnês em vários países da Europa e das Américas, apresentando-se em famosas igrejas e teatros.

Seu ardente desejo de evangelizar moveu-o a escrever obras que tiveram grande divulgação, com tiragens de centenas de milhares de cópias (chegando algumas a superar um milhão de exemplares), publicadas em português, espanhol, inglês, italiano, francês, polonês e albanês: “Fátima, aurora do terceiro milênio”, “O Rosário, a oração da paz”, “Sagrado Coração de Jesus, tesouro de bondade e de amor”, “Medalha Milagrosa, história e celestiais promessas”, “Via Sacra”, “Jacinta e Francisco, prediletos de Maria”, “Os Mistérios Luminosos do Rosário”, “Orações para o dia-a-dia” e outras. Três livros devem ser mencionados em especial pelos trabalhos prévios de pesquisa: “Mãe do Bom Conselho”, “Dona Lucília” e “Comentários ao Pequeno Ofício da Imaculada Conceição”.

É membro, dentre outras, da Sociedade Internacional Tomás de Aquino e da Academia Marial de Aparecida. Foi condecorado em diversos países por sua atividade cultural e científica, recebendo, por exemplo, a Medalha de Ciências do México. Desde 2002 tem publicado regularmente os comentários ao Evangelho, na revista Arautos do Evangelho, com edições em português, espanhol e italiano.

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